No momento atual, as empresas vêm lutando para se manter abertas e os empregados inseguros com a possibilidade de perderem seus empregos e preocupados como conseguirão manter a renda mensal de sua família durante esse período de isolamento e de calamidade pública.
Uma possibilidade de garantir a renda, ainda que provisoriamente, é através do saque do FGTS, o que vem sendo autorizado pelo Poder Judiciário ao liberar o levantamento dos depósitos fundiários por causa da pandemia do Covid-19.
O FGTS, Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, foi criado em 1966 como uma medida de proteção ao trabalhador demitido sem justa causa. Via de regra, durante a vigência do contrato de trabalho, o empregador é obrigado a depositar mensalmente em uma conta bancária aberta na Caixa Econômica Federal (CEF), em nome do trabalhador, o equivalente a 8% de seu salário.
Além da demissão sem justa causa, a lei do FGTS traz outras hipóteses em que o trabalhador poderá sacar os valores depositados, a exemplo da compra ou financiamento da casa própria, quando a conta vinculada não recebe depósitos por 3 anos seguido e quando o trabalhador se aposenta.
Há pouco tempo, o governo incluiu a partir de 2020 o saque-aniversário, permitindo aos trabalhadores optarem por essa modalidade de levantamento, sacar anualmente uma determinada quantia do saldo existente na sua conta do FGTS na data de seu aniversário.
Outra possibilidade de saque do FGTS, embora menos conhecida, ocorre quando o trabalhador passa por necessidades pessoais devido a situações de emergência ou estado de calamidade pública reconhecidas pelo Governo Federal, conforme previsto no artigo 20, inciso XVI, da Lei 8.036/90:
Art. 20. A conta vinculada do trabalhador no FGTS poderá ser movimentada nas seguintes situações:
XVI – necessidade pessoal, cuja urgência e gravidade decorra de desastre natural, conforme disposto em regulamento, observadas as seguintes condições:
a) o trabalhador deverá ser residente em áreas comprovadamente atingidas de Município ou do Distrito Federal em situação de emergência ou em estado de calamidade pública, formalmente reconhecidos pelo Governo Federal.
Ocorre que a citada lei não esclarece o que de fato pode ser considerado “desastre natural”.
A princípio a CEF se ampara no que dispõe o Decreto 5.113/90, que no seu artigo 2º, faz menção a nove situações legalmente reconhecidas como desastre natural:
Art. 2º Para os fins do disposto neste Decreto, considera-se desastre natural:
I – vendavais ou tempestades;
II – vendavais muito intensos ou ciclones extratropicais;
III – vendavais extremamente intensos, furacões, tufões ou ciclones tropicais;
IV – tornados e trombas d’água;
V – precipitações de granizos;
VI – enchentes ou inundações graduais;
VII – enxurradas ou inundações bruscas;
VIII – alagamentos; e
IX – inundações litorâneas provocadas pela brusca invasão do mar.
Note-se que todas as situações descritas no dispositivo legal acima citado estão relacionadas exclusivamente a água.
Assim com base nesse artigo é que a CEF vinha recusando administrativamente os pedidos de saque do FGTS em razão da pandemia pelo COVID-19, simplesmente por não constar como hipótese definida como desastres naturais.
Neste ponto, ao negar os pedidos de saque-calamidade por Covid-19, em tese, a CEF estaria seguindo estritamente o que determina a lei e o decreto. Porém, devido a gravidade da situação atual a própria CEF atualizou seu Manual através da Circular 903/2020 e vem autorizando o saque do FGTS devido a pandemia do Covid-19.
Todavia, nos casos em que a CEF negou o saque do FGTS por força maior, diversos foram os trabalhadores que tiveram que mover ações judiciais, sendo que o Poder Judiciário vem autorizando o levantamento dos depósitos fundiários.
Inclusive diversas são as decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de que a lista do artigo 20, da Lei 8.036/90, não é taxativa, ou seja, limitada apenas às situações definidas por escrito na lei; mas sim é uma lista exemplificativa, isto é, que outros itens podem ser incluídos em uma interpretação extensiva do caso concreto.
Desta forma, a maioria das decisões do STJ e dos demais tribunais são no sentido de determinar o saque do FGTS quando o trabalhador passa por necessidades financeiras, mesmo em situações não abarcadas na lei do FGTS, sob o argumento jurídico de que para a liberação do saque do saque do FGTS são a garantia dos direitos fundamentais do trabalhador, como o da moradia, e a aplicação da finalidade social da norma, além da não taxatividade das hipóteses elencadas no artigo 20, inciso XVI, da Lei 8.036/90 e dos desastres naturais do artigo 2º, do Decreto 5.113/90.
Assim, seja por considerar que as hipóteses de saque do FGTS vão além daquelas estipuladas no artigo 20 da Lei 8.036/90 ou seja por considerar que a lista dos desastres naturais vai além das listadas no artigo 2º do Decreto 5.113/90, o trabalhador faz jus ao saque-calamidade do FGTS neste momento crítico.
O que reforça a autorização para o saque-calamidade do FGTS é a decretação do estado de calamidade pública por causa do Covid-19 em âmbito federal através do Decreto Legislativo n. 6 de 20 de março de 2020
Além do mais, o Governo Federal publicou no dia 07/04/2020 a Medida Provisória (MP) 946, extinguindo o Fundo PIS-Pasep e transferindo seus recursos para o FGTS. A referida MP também libera um saque imediato único, independentemente do número de contas que o trabalhador possua, de R$ 1.045,00, a partir de 15 de junho de 2020, por causa da pandemia.
É certo que as medidas do Governo buscam efetivar a manutenção da subsistência das pessoas de baixa renda, assim como da saúde financeira das empresas e, por conseguinte, dos respectivos empregos.
Diante dessa situação, muitas são as ações judiciais promovidas pelos trabalhadores buscando o judiciário para autorizar o saque INTEGRAL do FGTS, principalmente ao se considerar que o saldo na conta vinculada do FGTS visar suprir a subsistência do trabalhador e de sua família diante da pandemia
É sabido que o FGTS é direito de todo e qualquer trabalhador. Portanto, antecipar o seu saque nada mais é do que uma via de enfrentamento à crise de modo a propiciar a sobrevivência do cidadão.
A pandemia causada pela COVID-19 vem ocasionando inúmeros prejuízos aos cidadãos e suas respectivas famílias, inclusive, com as demissões em massa que tem ocorrido em virtude de as empresas não conseguirem honrar com suas obrigações trabalhistas junto a seus colaboradores.
Portanto, acertadas as decisões do Poder Judiciário que autorizam o saque integral do FGTS aos cidadãos desempregados que não possuem outra fonte de renda para dar o mínimo de subsistência ao trabalhador e às suas famílias
Assim, possível concluir que o estado de calamidade pública (COVID-19), decretado através do Decreto 6/2020 pode se enquadrar no que a legislação denomina de “desastre natural” e, por conseguinte, o trabalhar deve ter reconhecido o direito ao saque do FGTS para garantir sua sobrevivência e havendo recusa por parte da CEF podem se valer do Poder Judiciário.
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Melissa Noronha M. de Souza Calabró é titular no escritório Melissa Noronha Advogados.
Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e em Coaching Jurídico, com formação em Professional & Self Coaching pelo IBC.
É membro efetivo da Comissão de Coaching Jurídico da OAB/SP.
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