Através do art. 51 da Medida Provisória 905/2019 (Contrato Verde e Amarelo) a alínea “d”, do inciso IV, do art. 21 da Lei 8.213/1991, que equiparava o acidente de trajeto como sendo acidente de trabalho, havia sido revogada e, consequentemente, qualquer acidente ocorrido no percurso da residência do empregado para o trabalho e do trabalho para sua residência tinha deixado de ser considerado acidente de trabalho sem gerar estabilidade no emprego, ainda que o afastamento fosse superior a 15 dias (Súmula 378, II do TST).
Desta forma, a partir da entrada em vigor da MP 905, havendo acidente de trabalho, as empresas não precisavam mais emitir a CAT – Comunicado de Acidente de Trabalho – e, sendo necessário o afastamento superior a 15 dias, o empregado deveria ser encaminhado para a Previdência Social para passar por perícia médica a fim de determinar o tempo de afastamento, período o qual o empregado iria perceber o auxílio-doença a partir do 16º dia de afastamento e não o auxílio-doença acidentário.
Entretanto, com a publicação da Medida Provisória 955/2020 que revogou a Medida Provisória 905/2019, a partir de 20/04/2020 o acidente de trajeto volta a ser equiparado a acidente de trabalho, ficando o empregador novamente responsável por emitir a CAT, além de o empregado acidentado voltar a ter estabilidade no emprego caso ficar afastado por mais de 15 dias e recebendo auxílio doença acidentário.
Em 20 de abril de 2020 o Presidente, Jair Bolsonaro, revogou a referida MP e afirmou que irá editar uma nova MP para tratar do Contrato Verde e Amarelo, com regras específicas para enfrentar a pandemia do novo coronavírus.
Contudo, enquanto não editada a nova MP e, eventualmente nova regra que exclua o acidente de trajeto como acidente de trabalho, volta a valer para fins previdenciários o disposto no artigo 21, inciso IV, alínea “d” na lei 8.231/91 e que equipara ao acidente do trabalho o acidente sofrido pelo trabalhador, ainda que fora do local e horário de trabalho, “no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do segurado”.
Se a MP 905 tivesse sido mantida o empregado que viesse a sofrer acidente no trajeto da residência para o trabalho ou vice versa deixaria de ter os direitos trabalhistas e previdenciários decorrentes do acidente de trabalho e, como dito, receberia o benefício auxílio-doença comum a partir do 16º dia de afastamento e não auxílio doença acidentário, bem como, não teria direito à estabilidade provisória no emprego.
Entretanto, devido a revogação da MP 905/2019, o empregado que vier a se acidentar durante o percurso de sua casa para o trabalho ou do trabalho para sua casa e havendo necessidade de ficar afastado por período superior a 15 dias deverá encaminhado à perícia do INSS que determinará o período de afastamento, receberá auxílio doença acidentário e volta a ter garantida a estabilidade no emprego que pela legislação vigente é de 12 meses a contar da alta médica, caso a convenção coletiva do sindicato não determine tempo ainda maior.
Com amparo no que dispõe o artigo 62, caput, da Constituição Federal, tendo a MP força de lei, há entendimentos no sentido de que permanecem válidos os contratos firmados entre 1 de janeiro e 20 de abril que devem seguir de acordo com as regras estabelecidas pela MP revogado e, nesses casos, os acidentes de trajeto não são considerados acidentes de trabalho.
Entretanto, há quem defenda a retroatividade dos efeitos da MP 905, como se todos os efeitos jurídicos por ela produzidos tivessem deixado de valer desde o dia de sua edição.
A nosso ver, esse entendimento traz maior instabilidade e insegurança às relações sociais e trabalhistas, haja vista, que não faria sentido adotar as regras previstas em uma medida provisória que se, caso não fosse convertida em lei ordinária, todos os negócios jurídicos praticados sob sua vigência tivessem perdido efeito por ausência de previsão legal.
Desta forma, entendemos para que não haja afronta ao ato jurídico perfeito e ao princípio da segurança jurídica, o melhor que as empresas tem a fazer com relação aos contratos “verdes e amarelos” firmados durante a vigência da MP 905/2019 é seguir em conformidade com os seus termos, via de consequência, os acidentes de trajeto havidos não podem ser considerados como acidentes de trabalho, como dispõe a Lei 8.213/91.
Vale ressaltar que não se caracteriza como acidente de trabalho o acidente de trajeto sofrido pelo empregado que, por interesse pessoal, tiver interrompido ou alterado o percurso habitual.
Em suma, os acidentes de trajeto que ocorrerem a partir de 20/04/2020 (data da revogação da MP 905/2019) voltam a ser equiparados a acidentes de trabalho e o empregado acidentado passa a ter direito à estabilidade no emprego caso haja o afastamento por mais de 15 dias e receberá auxílio doença acidentário.
Com relação aos acidentes de trajeto que acontecerem durante a vigência do contrato firmado sob a modalidade do contrato verde e amarelo a questão é controvertida, na medida em que há entendimentos de que não será considerado acidente de trabalho conforme as regras da MP revogada e há quem defenda que devido a retroatividade da lei deverá ser equiparado acidente de trabalho.
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Melissa Noronha M. de Souza Calabró é titular no escritório Melissa Noronha Advogados.
Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho e em Coaching Jurídico, com formação em Professional & Self Coaching pelo IBC.
É membro efetivo da Comissão de Coaching Jurídico da OAB/SP.
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2 Comments
Prezada Dra Melissa!
Primeiramente parabéns pelo brilhante trabalho, pela clareza e sua objetividade, tomei a liberdade de consulta-la para esclarecer minha duvida .
Ingressei com uma ação acidentária (acidente de percurso) , cujo evento ocorreu em 26/12/2019.
Portanto em pleno vigor da MP 905/2019.
O Juiz julgou improcedente, em 02/05/2022, em razão da MP.
Assim , Doutora , minha dúvida é:
Teria sucesso apelar alegando a retroatividade da lei devido a revogação da MP e também pelo fato do Contrato de Trabalho de meu cliente ser anterior à MP 905 (01/06/2016) ?
Dra Rosalva,
A meu ver o acidente que ocorreu durante a vigência da MP 905/2019, ou seja, entre 12/11/19 a 20/04/2020 não deve ser considerado acidente de trabalho. Portanto, a princípio correta a decisão do Juiz.
Todavia, existem divergências, pode ser que tenha alguma chance de êxito pela tese da retroatividade da lei.
Boa sorte